Continuando o que comecei aqui, numa espécie de processo de autoconhecimento e busca por dias melhores, hoje pretendo falar sobre família.
Talvez isso tenha relação (ou não) com meu histórico de morar em vários lugares, mas nasci numa cidade diferente de onde meus pais nasceram. Sou de uma cidade A, meu pai de uma cidade B e minha mãe de uma cidade C. Acho que nunca tive muito esse sentimento de pertencimento que as pessoas têm quando nascem e crescem num mesmo lugar, com famílias dos pais sendo do mesmo lugar.
Esse fato não gerou tantas mudanças assim e, até quase o início da minha vida adulta, só morei em duas cidades diferentes: a minha e a da minha mãe. Foi nessa última que cresci, dos 6 aos 17 anos. Saímos muito cedo da cidade onde eu nasci, segundo a minha mãe por problemas financeiros do meu pai. O que nunca entendi bem é porque ele ficou na cidade A e nós na cidade C. O que minha mãe conta, é que ele estava resolvendo problemas do trabalho e que nós iríamos todos para a cidade B no futuro. Acho que preciso conversar com ela de novo sobre esse assunto. Tenho certo receio de tratar disso com ela, pois acho que vai trazer lembranças ruins.
Depois de quase dois anos na cidade C, meu pai veio a falecer. Eu tenho ao menos uma lembrança dele, ainda na cidade A, sendo levado por pessoas numa cadeira de madeira para o hospital porque estava passando mal. Lembro que, na época que meu pai morreu, minha mãe tinha ido a cidade A, porque ele tinha passado mal de novo. Depois de dias de espera, eu acordo com minha mãe na porta do quarto falando comigo. Quando ela começa dizendo que das outras vezes ele tinha se recuperado mas dessa vez... Ela não precisou falar mais nada e desatei a chorar. Eu tinha quase 8 anos de idade nessa época.
Tenho poucas lembranças dele, para ser sincero. Lembro dele bravo comigo porque eu não queria comer ovo (até hoje não como). Lembro de outra vez que acordei e o vi tomando banho. Uma outra vez, em visita a nós na cidade C, lembro dele dentro do ônibus ajudando um menino vendedor de sorvete a mexer com alguém do lado de fora. É uma lembrança que tenho do meu pai gozador. Mas lembro também que naquele dia me senti meio deixado de lado, porque ele parecia preferir brincar com o menino.
Fora essas lembranças, não consigo me lembrar de mais nada. Não posso dizer que fui mais ou menos amado, porque lembro pouco dessa época na cidade A. Minha mãe diz que meu pai tinha loucura por nós 3, o que é uma característica de todos os irmãos dele e da minha avó paterna. Minha mãe conta outra história dele que gosto de compartilhar, porque acho bem engraçada. Todos os meus irmãos têm os sobrenomes maternos e paternos, menos eu, que só tenho o paterno. Quando falo meu nome, as pessoas perguntam: "Só isso?".
Curioso que nunca tive curiosidade de saber porque dessas diferenças de sobrenome, o que só fui questionar minha mãe tem poucos anos atrás. O que ela conta é que, quando eu nasci, meu pai bebeu muito para comemorar e, quando foi me registrar no cartório, só colocou o sobrenome dele e não o da minha mãe. Ela fica brava quando conta isso, mas eu acho muito engraçado. Pensem que foi apenas um sobrenome que ele esqueceu, quando eu poderia ter sido registrado com um nome estranho, como Brahma ou Antártica.
Enfim, eu sempre fiquei incomodado com o dia dos pais, especialmente na época de escola, porque todos poderiam fazer lembranças e eu tinha que arrumar alguém para dar, geralmente meu avô materno. Esse aliás, foi uma das figuras masculinas com quem cresci por perto. Mas meu principal modelo masculino foi meu irmão, apenas dois anos mais velho que eu, mas alguém muito muito especial para mim e sempre a frente do nosso tempo.
As pessoas que conviviam com meu pai sempre falavam que ele morreu porque não se cuidou. E acho que cresci ouvindo isso, que bebida é um problema e isso matou meu pai. Não tenho nenhuma lembrança de um pai alcoólatra, mas sempre essa imagem de que adorava uma cerveja, como toda a família paterna. Todos meus tios, irmãos dele, bebem muito mas nunca tiveram problema com cerveja, como os casos que escutamos por aí. No entanto, minha mãe fica muito incomodada com essa época, em que ela cita que ele bebia muito. Talvez tenha acontecido algo que ela nunca contou para nós, mas ela fica incomodada porque não gostava que ele bebia, assim como não gosto que os filhos bebam.
Como foi crescer sem pai? Bem, muito difícil. Não posso afirmar que isso é um determinante para meus problemas, porque meus irmãos passaram pelo mesmo e não têm transtornos psicológicos. Embora tenha me acostumado em não ter um pai, certas coisas me afetam muito. O Fábio Jr. tem uma música linda, chamada "Pai", que dedicou ao pai dele. Sempre que escuto essa música eu me emociono, pois me vejo naquela música.
O convívio diário com meu pai foi até os 6 anos de idade, com visitas esporádicas desde a nossa mudança para a cidade C até a morte dele. Mas me incomoda eu não ter lembranças dele, além das que eu já citei. Tenho receio de perguntar mais coisas para a minha mãe porque não quero despertar lembranças que possam fazê-la sofrer. Só que fico me perguntando porque, entre outras lembranças que tenho da cidade A, meu pai aparece em tão poucas. Não tenho tantas lembranças assim da cidade A, mas o fato dele aparecer em apenas duas me incomoda.
Talvez outras lembranças apareçam nesse processo, mas fiquei 5 minutos parado, desde o fim do parágrafo anterior, e não consigo me lembrar de nada.
Acho que para falar do capítulo família, eu tinha que começar pelo meu pai. Durou tão pouco e com tão poucas lembranças que eu gostaria de ter mais do que contar. Vamos ver o que sairá nas outras partes do capítulo família.
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